O projeto de lei que coíbe a arquitetura hostil em Balneário Camboriú, de autoria do Vereador Eduardo Zanatta (PT), foi divulgado nesta última quarta-feira, 27, em uma live no Instagram em conjunto com o Padre Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo da Rua de São Paulo, em com o fundador do Observatório da Aporofobia, Paulo Escobar. O termo aporofobia, segundo a filósofa espanhola Adela Cortina, se refere a quem pratica a “rejeição, aversão, medo e desprezo pelo pobre, pelo desamparado que, em aparência, não pode retribuir nada de valor”.
“O nosso projeto é fundamental para combater e reduzir a marginalização dos mais vulneráveis. Não podemos compactuar com a intolerância e o preconceito. Enquanto houver pessoas dormindo pelas ruas e passando fome, é de nós, agentes públicos, desenvolver políticas públicas para acolher e prezar pela dignidade dessas pessoas. Se alguns gostam de dizer que defendem a vida, vamos defender a vida dessas pessoas também. Como disse o Padre Júlio, não existe democracia quando se tem gente morrendo de fome e pessoas comendo do lixo” comenta Eduardo Zanatta.
Para o Padre Júlio Lancellotti, a aporofobia é criminalização do pobre. “São todos os sintomas de uma desordem. Buscam criminalizar de maneira sórdida e criminosa a pobreza […] Nós não podemos esconder os pobres, e nem culpabilizá-los”.
O PL Padre Júlio Lancellotti busca criar meios para coibir a arquitetura hostil, através da proibição de construção ou instalação de materiais, estruturas ou equipamentos com objetivo de afastar ou impedir o acesso e permanência das pessoas em locais públicos, como estacas em superfícies planas ou divisórias em bancos para evitar a permanência de pessoas em situação de rua. Agora o projeto tramitará na Câmara de Vereadores de Balneário Camboriú e, após passar pelas comissões, irá a plenário.
Texto: Assessoria do Vereador Eduardo Zanatta
Confira o projeto na íntegra:
Projeto de Lei Ordinária N.º 92/2022
Cria mecanismos para coibir a prática da arquitetura hostil em Balneário Camboriú, denominada “Lei Padre Júlio Lancellotti”.
Art. 1º – Para fins de aplicação da presente lei, considera-se:
I – Aporofobia: é o sentimento de aversão, desprezo, medo ou rejeição pela pobreza e pela pessoa em estado de pobreza ou desamparado.
II – Arquitetura hostil: a construção e/ou instalação de materiais, estruturas ou equipamentos com objetivo ou resultado de afastar ou impedir o acesso ou permanência no local.
III – Bens públicos: os bens públicos são aqueles de uso comum, especial ou dominical, conforme delimitado pelo artigo 98 do Código Civil Brasileiro, tais como praças, ruas, calçadas, edifícios dos órgãos públicos.
Art. 2º – A fim de coibir as práticas aporofóbicas em âmbito municipal, fica vedado o emprego nos bens públicos de materiais, estruturas, equipamentos e técnicas de arquitetura hostil que tenham como objetivo ou resultado o afastamento de pessoas em situação de rua, idosos, jovens e outros segmentos da população.
Art. 3º – Acrescenta-se o artigo 111-A, à Lei Ordinária nº. 300, de 13 de dezembro de 1974, que passa a ter a seguinte redação:
“Art. 111-A – A arquitetura urbana dos bens públicos devem promover o conforto, abrigo, descanso, bem estar e acessibilidade na fruição dos espaços livres de uso público, de seu mobiliário e de suas interfaces com os espaços de uso privado, vedado o emprego de materiais, estruturas, equipamentos e técnicas de arquitetura hostil que tenham como objetivo ou resultado o afastamento de pessoas em situação de rua, idosos, jovens e outros segmentos da população.”
Art. 4º – Altera-se o artigo 10 da Lei Ordinária 301, de 13 de dezembro de 1974, acrescendo-o parágrafo único, que passa a ter a seguinte redação:
“Art. 10 – […]
Parágrafo único. Como forma de manter harmonia entre os bens particulares e bens públicos, fica vedado o emprego de materiais, estruturas, equipamentos e técnicas de arquitetura hostil em locais limítrofes entre a propriedade pública e privada, que tenham como objetivo ou resultado o afastamento de pessoas em situação de rua, idosos, jovens e outros segmentos da população.” (NR)
Art. 5º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Eduardo Zanatta (PT)
Vereador
JUSTIFICATIVA
O conceito de aporofobia é relativamente recente, criado pela professora doutora da Universidade de Valência (ESP), Adela Cortina, que em sua obra “Aporofobia, el rechazo ao pobre: um desafío para la democracia”, conceitua a Aporofobia como:
Rejeição, aversão, medo e desprezo pelo pobre, pelo desamparado que, em aparência, não pode retribuir nada de valor. (tradução livre).
Em palavras mais singelas, a aporofobia é a rejeição ao pobre, que muitas vezes, como defende a autora do termo, se desenvolve de forma quase invisível através de conceitos culturais e de costumes na sociedade. Contudo, trazer ao senso comum tal conceito, faz parte do combate à ações discriminatórias, violentas e abusivas que estão inseridas no cotidiano social.
Importante mencionar que, a República Federativa do Brasil tem como objetivo precípuo a erradicação de qualquer preconceito, promovendo o bem estar de toda população, conforme o artigo 3º, IV, da Constituição Federal.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
[…]
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Igualmente, é competência comum entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios o combate às causas da pobreza e os fatores da marginalização, conforme previsto na Constituição Federal, artigo 23, mas também replicado na Lei Orgânica do Município de Balneário Camboriú.
Art. 15 – É da competência comum do Município, da União e do Estado, na forma prevista em lei complementar federal:
[…]
XI – combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização promovendo a integração social dos setores desfavorecidos;
O combate a aporofobia é parte fundamental para reduzir a marginalização dos mais vulneráveis, promovendo a sua inserção social e comunitária, sendo também um meio para redução da pobreza.
Entre os entes da federação brasileira, a cidade é local onde as pessoas efetivamente moram e também é onde o cidadão tem a porta de acesso a todos os programas sociais e de renda. Por esses motivos que a cidade deve acolher e incluir todos os indivíduos no meio social.
Nas palavras do Padre Júlio Lancellotti, maior nome brasileiro no combate a aporofobia, “Uma cidade precisa ser hospitaleira para os pobres, para os indesejáveis. Esse é o nosso grande desafio civilizatório e o grande desafio de sermos de verdade uma democracia. Porque, por enquanto, a democracia é só um conceito na nossa cabeça. Não existe democracia quando tem gente morrendo de fome, pessoas comendo do lixo”
Como diz o próprio hino de Balneário Camboriú, nossa cidade é hospitaleira, e como tal, deve acolher e prezar pela dignidade de todos os seus habitantes. Por isso se apresenta este projeto de lei, como mais um passo para combater a pobreza e qualquer espécie de preconceito.
Eduardo Zanatta (PT)
Vereador